Acho que estou com um problema grave.
Disse aqui que terminei de ler nesta semana o Catcher in the Rye do J. D. Salinger. Gosto de variar bastante as minhas leituras e estava me preparando para começar a ler o How to Read and Why de Harold Bloom.
Na noite (na verdade já era madrugada) de quinta para sexta-feira estava lá eu me debatendo com as primeira páginas do (longo) prefácio e, confesso, concluí que ainda não é a hora de ler Bloom no original. Não estou pronto ainda. E muito menos de madrugada, cansado e com sono. Livro de volta para a pilha, luz apagada, beijo na Nancy e fui dormir.
Manhã seguinte entrei no escritório e, em cima da pilha “por ler”, gritanto pela minha atenção com sua capa prateada e seu título meio “explodido” estava o Survivor de Chuck Palahniuk. Comecei o livro. E está difícil largar. Se você nunca ouviu falar de Palahniuk, ele é aquele doido que escreveu Clube da Luta (Fight Club), Invisible Monsters e Choke .
Se você assistiu ao filme Clube da Luta e gostou, saiba que é uma ótima adaptação do livro. O clima está todo lá. As personagens estão lá. Palahniuk está lá. E se vc assistiu o filme já sabe que não é exatamente uma obra para adolescentes. Pois bem, Survivor é na mesma linha. Tire da sua lista de presentes, se o aniversariante tem menos de 21 anos.
O livro é a narração feita em primeira pessoa de um egresso de uma comunidade religiosa. Ele seqüestrou um avião, obrigou os passageiros a desembarcar, decolou novamente com o piloto e, depois que este saltou de para-quedas, ligou o piloto automático, serviu-se de algumas doses de vodca da primeira classe e está na cabine de comando, ditando suas memórias para o gravador de bordo. A aeronave está programada para voar até terminar o combustível quando então as quatro turbinas vão apagar e todas aquelas toneladas de metal vão se transformar em uma enorme cratera quando se chocarem contra o solo avermelhado do deserto australiano.
Ele não tem nada a perder. Nunca teve. Conta que seu telefone apareceu por engano em uma daquelas hot lines para onde as pessoas em crise telefonam. É quando ele brinca de deus, dispensando conselhos, estímulo, a vida e, quando está de saco cheio, a morte. Conta como induzir uma pessoa em crise ao suicídio, mas adverte para afastar o telefone do ouvido ou o estrondo do tiro do outro lado da linha vai prejudicar seu ouvido.
Ainda não sei tudo o que vai acontecer. Estou nas primeiras páginas. Na verdade estou na página 259… não… eu não leio tão rápido assim. É que o livro foi diagramado com as páginas em ordem decrescente. É uma contagem regressiva, obsessiva, até o final. Genial. Adoro este tipo de “coisinha” que contribui para a resposta emocional de quem lê a obra. Se bem que o próprio texto faz isto sozinho, sem artifícios.
Dois pequenos trechos:
To calm this girl down, to get her to listen, I tell her the story about my fish. This is fish number six hundred and forty-one in a lifetime of goldfish. My parents bought me the first one to teach me about loving and caring for another living breathing creature of God. Six hundred and forty fish later, the only thing I know is everything you love wil die.
Outro…
And maybe this is just a trick of the light, but I´ve eaten almost the whole lobster before I notice the heart beat.
E por aí a coisa vai. O clima é o mesmo, as perverções são diferentes, a tensão é mesma, as personagens são diferentes. Mas o texto, em sua essência, é um Palahniuk. E ninguém precisa de mais do que algumas páginas para reconhecer. Se ele fosse um cheiro, seria um mau cheiro. Um inesquecível mau cheiro.
O que me leva ao começo deste post: eu tenho um problema. Como já deu para perceber eu gosto de tudo um pouco. Sou um generalista. Ouço de tudo, leio de tudo, gosto de escrever sobre tudo. Tenho dois livros publicados, um de contos (com tudo quanto é tipo de assunto) e um romance de gênero incerto. Talvez seja ficção científica. Acho que não. Gosto de pensar que é um estilo “ficção que dói”.
Terminei meu terceiro livro que é um thriller e estou com mais quatro rascunhos: um de crônicas, outro thriller, um romance (não é “gênero romance”… é romance mesmo) e um policial. Quer dizer, meu interesse diversificado afeta minha produção. O que significa dizer que não tenho um nicho.
O que significa dizer que não tenho público definido.
O que significa dizer que a cada publicação eu preciso me reinventar como escritor e como me posicionar frente ao leitor.
O que significa dizer que a publicidade em torno do lançamento de um novo livro precisa ser direcionada para públicos diferentes.
O que significa dizer que eu sou um autor caro para publicar.
O que significa dizer, claro, que nunca vou conseguir nada no mercado literário.
Fazer o que? Escrever o que?
Voltar a advogar?
Vou fazer de conta que não li as últimas três frases deste post.
Sei que sou suspeita para falar, mas você é um dos escritores mais talentosos que já tive contato (direto ou indireto).
Nem vem que não tem meu amor. Você vai conseguir! No Brasil é assim mesmo: Além de talento tem que ter MUITA paciência e FÉ, e um pouquinho de sorte.
Palahniuk escreve bem, apesar de soar um pouco “primo gótico chato e indiferente” ás vezes. Não são livros de auto-ajuda, mas saber que você não é o único a fermentar as frustrações e angústias da vida com tanta fúria é reconfortante… Fico me perguntando o que aquele retardado que descarregou a arma no cinema faria se o tivesse lido antes. Provavelmente levaria munição extra…
Fábio,
Confesso que desconhecia os outros livros do Palahniuk. Amei o original do “Fight Club” (gostei menos da versão em filme, apesar de ainda assim considerá-lo genial). Vou correndo ler os outros livros, e obrigada pela recomendação!
Putz, cai aqui por acaso, mas fiquei louca pra ler o livro do Palahniuk.
Isso é um site? Um blog? Vou dar uma vasculhada por ai…